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Paternidade

Até hoje, não acreditava que tinha deixado minha marca no Mundo. Na verdade, tenho certeza disto. Já trabalhei em vários processos de relevância nacional, e algumas vezes dei a sorte de participar de boas vitórias. Mas vitórias profissionais deixaram a marca em mim, não no mundo. Já pratiquei atos bondosos para com os outros, amigos ou estranhos, mas nunca os considerei uma marca no mundo. Já tirei boas notas, ou fui um bom filho e irmão, já conquistei vitórias esportivas (pasmem!), mas nada disso ultrapassava os limites do meu próprio ser.

Minha filha, então, nasceu, e aí sim, pude perceber, que agora eu havia marcado o mundo.

Falo com a autoridade de um pai novo. Novo não na idade, mas no tempo dedicado à missão. Então, se forem besteira, ou não alcançarem a beleza do que diz @piangers, ou o impacto que tem @sameragi, desconsiderem e perdoem.

Trago, de início, a primeira memória sobre paternidade – e a mais impactante. A de meu pai, todos os sábados pela manhã, bem cedo, me buscando para passarmos o dia junto. Não lembro de presentes, lembro da presença. De dormir no colo dele assistindo um filme. Do nosso ritual do cinema. De passar a mão na careca dele. Do jeito que ele roncava, sorria e falava. Do jeito que ele escutava tudo sem julgar. De como ele estava presente, mesmo quando ausente.

Meu pai faleceu quando eu era muito novo, mas deixou uma parte sua em cada parte minha. A memória de sua presença guia cada um dos meus passos.

Anos depois, conheci meu sogro, presença total para toda sua família. Era puro amor e carinho, não tinha uma única vez que minha esposa não recebesse um coração desenhado no ar, com os dedos, acompanhado de um: “nininha, te amo”, quando ela deixava sua casa. No ciclo da vida, meu sogro também se foi, mas deixou uma parte dele em cada parte da minha esposa.

Meu pai não conheceu minha filha. Nem o pai da minha esposa.

Minha pequena faz seis meses em poucos dias. E, por incrível que possa lhe parecer, ela conhece o meu pai e o pai da minha esposa. Conhece porque todos os dias, nesses cinco meses, eu busquei estar presente para ela. Estive lá, sendo não só eu, mas também meu pai e meu sogro. Todos nós dando nosso melhor, diariamente.

Curiosamente, a lição da presença, minha memória mais forte do meu pai, foi a primeira que também a minha filha me deu.

É que minha filha nasceu com certa dificuldade respiratória. Uma bebezinha recém vinda ao mundo, cinza, com tubos. Foi para a unidade de terapia intensiva nos seus primeiros dias de vida. Estive com ela durante todo o dia, e especialmente à noite. Eu queria que ela tivesse a certeza de que eu estava lá, presente. Ela me pedia isso, me ensinava que, dali para a frente, essa era minha missão.

Nem sempre é fácil. Nesses primeiros meses, já tiveram dias que a vi pouco, em razão do trabalho, e foram dias terríveis. Vivi momentos em que o cansaço fez com que eu reclamasse de ter de desempenhar a função mais linda da minha vida. Em outros, me considerei injustiçado por fazer o básico. O substantivo (porque expressa sentimento) presença traz uma ideia simples, mas nem sempre é fácil estar presente. A questão é que tudo na minha vida que realmente valeu a pena, requereu esforço.

O que eu quero passar é o seguinte. Esses dias, no curso de inglês, o professor perguntou o que teria ocorrido de interessante no meu dia. Eu havia lidado com Ministros, empresários. Trabalhado em um processo complexo. Coisas da obra. Estudo de inglês. Texto do mestrado.

E na minha mente só vinha uma imagem: a da minha filha sorrindo. É um momento em que ela mal abriu os olhos, quando o dia ainda está meio escuro e meio claro, mas de repente ela nota que eu estou ali, ao lado dela, e sorri. É um agradecimento de alma pela minha presença. O momento mais interessante do meu dia, definitivamente.

Ser pai é presença. Não existe um manual. Um caminho certo. O importante é estar lá, e descobrir o próximo passo junto. Se pudesse falar uma única coisa sobre paternidade seria isso

Então para todos aqueles cujos pais já se foram, peço que a lembrança da presença deles faça o dia dos pais de vocês mais feliz. Assim como meu pai vive em mim, o de vocês também está presente, mesmo se ausente. Para todos aqueles cujos pais ainda estão aqui, desejo que quaisquer dificuldades desapareçam, e que estejam ambos presentes, um para o outro, descobrindo o próximo passo juntos. Para aqueles, finalmente, que são pais – ou que logo serão –, que o sorriso de seus filhos seja sempre o maior estímulo para serem presença. No final, é essa a herança que deixamos. A nossa marca no mundo.

Thiago Borges Veloso
Pai da Maria Luíza (Malu)
Advogado
Pós graduado em direito e processo do trabalho
Pós graduado em direito público